domingo, 6 de março de 2011


A “ditadura do relativismo” - o homem, a ciência, a verdade e a fé

Por: Vanderson de Sousa Silva, Mestrando em Teologia pela PUC-RJ, pedagogo, filósofo e graduando-se em Ciências Sociais pela UFF. (semvanderson@hotmail.com)

1. A pseudo-redenção científica


Muitas correntes filosóficas, políticas, sociológicas e teológicas, vislumbram o homem de forma muito otimista e até mesmo, ingênua. Não seria este o problema enfrentado pela modernidade que construiu seu “arca bolso”, sob uma concepção demasiado otimista do homem e da ciência produzida por este?
O homem moderno, vislumbrado com o avanço científico e as conquistas da razão humana, construiu sua cosmovisão, na razão e nos ditames do critério empírico-científico. O único critério de verdade passou a ser a razão, não a racionabilidade humana, que deve sim ser critério de verdade, mas antes, o raciocínio científico, provado empiricamente. Percebe-se a diferença entre racionabilidade e raciocínio “científico”? Mesmo que sutil a primeira vista, na verdade constitui-se um “grande abismo”.
A modernidade substituiu a razão, enquanto razoabilidade e raciocínio, pelo raciocínio científico de caráter matemático-empirista e mais ainda, este como critério de verificação do que é verdadeiro. A “Verdade” não mais é critério da própria razão, mas antes a “razão cientificista” é o critério para a verdade, enquanto a ciência demarca o que é falso do que é “verdadeiro”.
Esta substituição, ou melhor, esta usurpação indevida, gerou quase um endeusamento da ciência. A Modernidade acreditou que a ciência seria sua redentora, que com o progresso científico se chegaria a um mundo quase paradisíaco, onde pela ciência se chegaria a controlar tudo: o homem e a natureza. E por que não a Deus?
Esta “deusa moderna” – a Razão Científica, conduziu o homem a uma postura nunca observada antes na história. Muitas correntes modernas de índole científico-ideológicas e sócio-políticas, levaram a uma ruptura total com a história passada, visto que, a verdadeira evolução da razão, faz-se na continuidade-descontinuada de aspectos, já vislumbrados pelas gerações humanas que nos precederam, nunca uma postura de total indiferença pelo “já pensado do homem”. A vanguarda, enquanto, busca do “novo”, pode mascarar a “evolução”, que na realidade torna-se um desprezo pelo “caminho” já percorrido. Não permitindo ao homem continuar o “caminho”, mas antes ignorando o “passado”, caminha às apalpadelas na escuridão do conhecimento que gera a verdade, seja ela, negativa ou positiva.
Entre as correntes modernas destacam-se: marxismo, existencialismo, historicismo, políticas totalitaristas, comunismo, niilismo, cientificismo, teorias psicológicas reducionistas etc... Estas correntes de pensamento moderno não cumpriram seu papel de “verdadeira ciência”, visto que, excluíam aspectos, parcialmente ou totalmente da realidade.
Sendo o homem e a natureza seres complexos, não abarcariam estas correntes particularistas e excludentes a complexidade dos mesmos. Não alcança-se a “verdade da razão” absolutizando aspectos parciais em detrimento de outros, exemplificando: olhar o psiquismo do homem somente pela ótica da sexualidade-afetividade seria um erro. O homem é um ser sexual, de fato, este aspecto exerce influência sobre seu ser - psíquico, físico, volitivo e intelectual, mas não é o único aspecto do homem, nem mesmo o que mais influi sobre o mesmo. Decorre-se deste fato, que a possibilidade de construção de um sistema científico que não leve em conta a totalidade da realidade, é decorrência da própria fragmentação do homem moderno. Assim, a absolutização de um aspecto do real pelo sistema qualquer que seja, levará certamente a resultados parciais e inverídicos, pois isto feito, não cumpre-se o papel de verdadeira “ciência”, nem mesmo se alcança a VERDADE.
O homem contemporâneo corre o risco de perder-se em meio a pseudo-verdades, que revestidas de uma não menos pseudo-razão, contradizem-se levando a uma não percepção do que seja “verdade”. Basta pensarmos nas diversas correntes, sistemas e teorias, estas não raras vezes, anulam-se mutuamente. Não que a pesquisa e o “fazer” ciência, não gere anulações, estas até são necessárias para o progresso gnosiológico, no entanto, o que discutimos é a absolutização que muitos cientistas e pesquisadores fazem de determinados sistemas equívocos, que tornam-se pseudo-verdades, revestidas de uma aparência de verdade.
O próprio conceito de verdade foi abolido do discurso contemporâneo, nada é estável, sólido, permanente, tudo tornou-se efêmero, descartável, modismo, “passa-tempo”. Quando a religião prega a Verdade, seu discurso soa fundamentalista, não ecumênico, não respeitador da diversidade. Este discurso falacioso, apresentado como respeito ao pensamento, um outro ponto de vista, processo de alteridade, na verdade esconde sorrateiramente algo de muito perigoso, até mesmo destruidor, pois impede a busca do absoluto – tanto no sentido de algo verdadeiro, como de Absoluto com letra maiúscula referindo-se à Deus. Assim, podemos compreender o paganismo contemporâneo, se nada é absoluto, logo Deus está morto! Vimemos na “ditadura do relativismo”.
A verdade como meta do agir humano, no sentido mais filosófico e teleológico do termo, foi colocado em questão pela “pseudo-redenção” cientificista. Ao transpor para a ciência uma tarefa redentora, esta, passa a ocupar um lugar nunca antes pensado pelo homem da antiguidade e do medievo. Para estes, com suas nuâncias particulares, a tarefa da ciência era sim de alcançar a verdade, mas como participação na falibilidade de todo empreendimento humano. Portanto, pela ciência, enquanto criação do gênio humano participa de todas as grandezas e mediocridades do próprio mentor.

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